MEI representa 10% dos contribuintes da Previdência, mas só 1% da arrecadação

11/04/2023 | Notícias | 0 Comentários

Por Idiana Tomazelli 

Pesquisadores alertam para risco que expansão da modalidade traz ao financiamento das aposentadorias

Os MEIs (microempreendedores individuais) já representam 10% dos contribuintes da Previdência Social no país, mas apenas 1% da arrecadação do regime geral, num indicativo de que a ampliação do regime tributário simplificado acabou fragilizando a base de arrecadação do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).

A conclusão é apresentada pelos pesquisadores Rogério Nagamine Costanzi, ex-subsecretário do Regime Geral de Previdência Social, e Mário Magalhães, cientista social e assessor do Departamento do RGPS no Ministério da Previdência Social, em artigo publicado pela Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas).

O dado é considerado preocupante, sobretudo em um contexto de déficit na Previdência. O rombo do INSS chegou a R$ 261,3 bilhões no ano passado, o equivalente a 2,7% do PIB (Produto Interno Bruto). Quanto maior é esse desequilíbrio, maior é o esforço que o governo precisa fazer para arrecadar outros tributos e gastar menos com as demais políticas para conseguir manter as contas em trajetória saudável.

Neste ano, por exemplo, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) prevê um déficit de R$ 107,6 bilhões, mas o rombo na Previdência é estimado em R$ 261,4 bilhões —com tendência de alta, por causa do novo reajuste do salário mínimo.

Os pesquisadores defendem mudanças no regime para barrar a expansão acelerada desse tipo de segurado, promover “correção de rumos” e minimizar prejuízos “normalmente negligenciados pelos interesses eleitorais de curto prazo”.
O MEI foi criado no fim de 2008 sob a bandeira de tirar empreendedores da informalidade. O principal atrativo do modelo é o acesso a benefícios como aposentadoria e auxílio-doença mediante o recolhimento unificado de tributos federais, estaduais e municipais, com alíquotas subsidiadas.

A parcela da Previdência, por exemplo, corresponde a 5% do salário mínimo (hoje em R$ 1.302), o equivalente a R$ 65,10 mensais. A cobrança é menor do que a incidente sobre trabalhadores com carteira assinada, que pagam entre 7,5% e 14%, sem contar a contribuição do empregador, de 20% sobre o valor do salário. O desconto para os trabalhadores é feito por meio de um cálculo progressivo, conforme as faixas salariais.

Diante das facilidades, o regime do MEI tem atraído um número cada vez maior de inscritos. No fim de 2022, eram 14,8 milhões de microempreendedores, embora nem todos mantenham suas contribuições em dia.

O Congresso também facilitou as condições para que mais trabalhadores pudessem se enquadrar na categoria, elevando o limite de faturamento anual dos originais R$ 36 mil para R$ 81 mil no fim de 2021 —um ganho de 125%, mais que a inflação do período (112,15%).

Já há projetos em tramitação no Congresso para ampliar ainda mais esse limite, com valores entre R$ 130 mil e R$ 145 mil —com impactos sobre a receita tributária do governo.

Os pesquisadores mostram que, entre 2011 e 2021, o número médio mensal de contribuintes do INSS teve um aumento de 13,4%, mas o principal ganho veio dos MEIs, cuja expansão foi de expressivos 764,2% no mesmo período. Eles saíram de uma média de 581 mil contribuintes mensais em 2011 para 5 milhões ao final do período.

Enquanto isso, houve queda em modalidades como empregado doméstico com carteira (-13,3%) e contribuinte individual com plano completo, sem subsídio (-3,7%). A média de contribuintes entre trabalhadores com carteira assinada, público que reúne o maior número absoluto de segurados do INSS, subiu no período, mas em ritmo mais tímido: 6,2%.

“A mudança muito expressiva na composição dos contribuintes individuais também reforça os indícios de que parte relevante do MEI não necessariamente pode ser considerada como redução da informalidade”, diz o artigo.

“Uma parcela relevante pode ser atribuída à migração das categorias de contribuintes que não gozam de subsídios, o que fragiliza o financiamento do RGPS, reduz a proteção social trabalhista, amplia os desequilíbrios atuariais do RGPS e não traz ganho estrutural ou relevante em termos de cobertura previdenciária”, afirma o texto.

Outro indício de que o MEI não impulsionou a formalização é o fato de que a cobertura previdenciária medida pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) pouco se alterou nos últimos anos. No fim de 2022, a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua indicava que 64,7% dos trabalhadores contribuíam para a Previdência, patamar até inferior aos 66% observados no fim de 2015.

Em outro estudo, Nagamine havia detectado que 56% dos MEIs inscritos entre 2009 e 2014 já haviam realizado alguma contribuição à Previdência Social em momento anterior ao seu ingresso no regime simplificado, percentual que sinaliza a migração expressiva de trabalhadores.

Como resultado, o MEI vem crescendo em participação no número total de segurados da Previdência. Em 2011, os microempreendedores eram 1,2% da média mensal de contribuintes do INSS. Em 2021, a proporção subiu a 9,3%.

Quando considerada a quantidade de segurados que fizeram ao menos uma contribuição no ano, os MEIs representavam 1,6% do total do RGPS em 2011 e 10,6% uma década depois.

“Esse forte incremento da participação do MEI no total de contribuintes do RGPS já vem provocando efeitos deletérios na arrecadação do referido regime. Em 2021, por exemplo, a receita decorrente do MEI representou apenas 0,98% da receita do RGPS”, diz o estudo.

Em 2022, essa proporção não mudou de forma significativa. A arrecadação com os microempreendedores ficou em 1,05% do total recolhido pelo INSS.

A preocupação dos pesquisadores existe porque no futuro, ao preencherem os requisitos mínimos de aposentadoria, os microempreendedores terão direito a um benefício no valor de um salário mínimo —ainda que seu esforço contributivo tenha sido menor do que o dos demais trabalhadores.

“Tudo indica que esse processo de migração vem afetando negativamente, e em proporção não desprezível, o equilíbrio financeiro do RGPS, considerando que a alíquota do MEI é extremamente subsidiada do ponto de vista atuarial, com suas despesas superando em muito suas receitas”, alerta.

A arrecadação líquida do RGPS como proporção do PIB era 5,16% em 2007, chegou ao pico de 5,84% do PIB entre 2014 e 2015, quando passou a cair continuamente. Em 2021, ficou em 5,19% do PIB, retomando o patamar de 14 anos antes.

A EXPANSÃO DO MEI

Média mensal de contribuintes (2011)

  • Todas as modalidades – 47.725.150
  • MEI – 581.349
  • MEIs em relação ao total – 1,2%

Média mensal de contribuintes (2021)

  • Todas as modalidades – 54.120.377
  • MEI – 5.023.918
  • MEIs em relação ao total – 9,3%

Arrecadação líquida do RGPS (2021)

  • Total – R$ 462,2 bilhões
  • MEI – R$ 4,5 bilhões
  • MEIs em relação ao total – 0,98%

Arrecadação líquida do RGPS (2022)

  • Total – R$ 535,7 bilhões
  • MEI – R$ 5,6 bilhões
  • MEIs em relação ao total – 1,05%

Fonte: Folha de SP (https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2023/04/mei-representa-10-dos-contribuintes-da-previdencia-mas-so-1-da-arrecadacao.shtml)

 

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